Bodhidharma - Procurar Budha

Tentar achar um buda ou iluminação é como tentar agarrar o espaço. O espaço tem nome mas nenhuma forma. Não é algo que você possa pegar ou largar. E você certamente não pode agarrá-lo. Além dessa mente você nunca verá um buda. O buda é um produto de sua mente. Por que procurar um buda além dessa mente?
As pessoas estão iludidas. Elas não são conscientes de que suas próprias mentes são o buda. Do contrário, elas não procurariam por um buda fora da mente.

Kokoro; Shin 


Obs: O Ideograma para mente é o mesmo usado para coração e espírito, deste modo, não devemos ficar limitados a tradução utilizada no texto, pois este termo é muito abrangente.

Bodhidharma - Esboço da prática




Bodhidharma nasceu em torno do ano 440 em Kanchi, capital do reino sulista indiano de Pallawa. Ele era um brâmane de nascimento e o terceiro filho do Rei Simhavarman. Quando ele era jovem, ele converteu-se ao budismo, e mais tarde o Dharma lhe foi ensinado por Prajnatara, de Magadha, que foi convidado pelo seu pai. Magadha era o antigo centro do budismo. Também foi Prajnatara quem disse para Bodhidharma ir para China. Uma vez que a tradicional rota terrestre estava bloqueada pelos hunos, e uma vez que Pallawa tinha laços comerciais por todo Sudeste Asiático, Bodhidharma partiu de navio de um porto nas proximidades, Mahaballipuram. Depois de contornar a costa da Índia e a Península da Malásia por três anos, ele finalmente chegou ao sul da China ao redor do ano 475.

Muitas estradas levam ao caminho, mas basicamente há apenas duas: prática e dicernimento. 

Entrar pelo discernimento significa ver aquilo que é, através de ensinamentos e acreditar que todos seres vivos compartilham a mesma natureza, a qual é dissimulada pela sensação e ilusão. Aqueles que saem da ilusão para a realidade, os que meditam defronte à parede, a ausência de dualismo, a unidade de mortalidade e sabedoria, e que permanecem imóveis  perante às escrituras estão em concordância completa e óbvia com o dicernimento. Sem se moverem, sem esforços, eles entram, dizemos, pelo dicernimento.

Entrar pela prática refere-se as Quatro Práticas,  levadas em consideração: sofrer adversidades, hamornizar-se às condições, nada buscar e praticar o Dharma.

Primeiramente, sofrer adversidades. 
Quando aqueles que buscam o caminho encontram adversidades deveriam pensar: "por incontável tempo tenho dedicado-me ao trivial em detrimento do essencial e vagueado em todo tipo de existência, raivoso sem motivo e culpado de inúmeras transgressões. Agora, embora eu não cometa erros, sou punido pelas conseqüências de minhas ações. Nem os deuses nem os homens podem antever quando uma má ação frutificará. Aceito isso de coração aberto e sem reclamação." Dizem os sutras: "Quando você encontra adversidades não se exaspere, ela é conseqüência de suas ações". Com tal entendimento você está em harmonia com a razão. E ao sofrer, você entra no Caminho.

Em segundo, adaptando-se às condições. 
Como mortais, somos regidos por condições e não por nós mesmos. Todo sofrimento e toda alegria que experimentamos depende de cauas e condições. Se devêssemos ser agraciados por algum grande prêmio, tal como fama ou fortuna, é o fruto da semente plantada por nós no passado. Quando mudam as condições, isso cessa. Por que deliciar-me com esta existência? Mas, enquanto o sucesso e o insucesso dependem de condições, a mente não cresce nem diminui. Aqueles que permanecem imóveis perante os ventos da alegria e da tristeza, silenciosamente seguem o Caminho.

Em terceiro, nada buscar. 
As pessoas estão iludidas. Estão sempre ansiando por algo, sempre, por assim dizer, buscando. Mas os sábios despertam. Eles escolhem o dicernimento em vez dos hábitos. Eles fixam suas mentes na natureza dos fenômenos e deixam seus corpos mudarem com as estações. Todos os fenômenos são vazios de si mesmo Eles nada contêm que valha se apegar. A Calamidade alterna-se com a Prosperidade. Habitar nos três reinos (desejo, raiva e ignorância) é habitar numa casa em chamas. Apegar-se ao corpo (forma) é insatisfação.  Aqueles que compreendem isso desapegam-se de todas as coisas existentes e param de imaginar ou buscar algo. Os sutras dizem: "Buscar é insatisfação. Nada buscar é encontrar a satisfação". Quando você nada busca, você está no Caminho.

Em quarto, praticar o Dharma.
O Dharma é a afirmação de que todas as naturezas são puras. Através dessa verdade, todas aparências são vazias de si mesmo. Decadência e apego, sujeito e objeto são vazios, apenas discriminações. Os sutras dizem: "O Dharma não inclui seres, pois o Dharma está livre da noção de 'eu'." Aqueles que são sábios o suficiente para entender esta verdade estão ligados à prática de acordo com o Dharma. E uma vez que isso é real, incluindo que nada vale a pena buscar, eles dão seus corpos, vidas e propriedades em caridade, sem lamentar e sem a vaidade do doador, do presente ou do presenteado. E, para eliminar a ignorância, eles ensinam, mas sem apegarem-se à forma. Assim, através de sua própria prática, eles são capazes beneficiar os seres. E, assim como a caridade, eles também praticam as outras virtudes. Mas enquanto praticam as seis virtudes (generosidade, preceitos, paciência, esforço, concentração e sabedoria) para eliminar a ilusão, eles nada praticam. Isso é conhecido por "praticar o Dharma".

Como aprender sobre o budismo se não há um templo próximo?

Ao final de um texto publicado em seu blog, Folhas no Caminho, o Prof Sasaki encerra dizendo:

"No novo artigo que apareceu hoje no site brasileiro de Ajahn Buddhadasa, chamado "Unidade na Diversidade", e que conta um pouco da amizade entre Tan Ajahn e um grande amigo muçulmano, este diz das dificuldades de ir visitar o mestre:

"Nós tivemos que pegar um trem de Bangkok e chegamos em Chaiya às 4:00h da manhã. Phra Kuang e eu tivemos que esperar na estação até estar claro o suficiente. Então caminhamos através dos campos e florestas. Era a estação chuvosa, e de vez em quando tinhamos que atravessar águas chegando até a nossos peitos. Mas eu nunca pensei em desistir.”

"Eu costumava subir o Phu Kradueng em Loei quando ainda era uma selva. Aquilo era realmente difícil - mas no topo das colinas, o ar fresco e puro me fazia sentir como se eu estivesse em outro mundo, e todo o cansaço ia embora.”

"Eu tive que caminhar muito tempo antes que alcançasse Suan Mokkh, mas não me sentia nada cansado. Eu fui confortado pelo pensamento de que eu iria obter um discernimento do Dhamma de um monge cujas idéias eram muito diferentes do que eu tinha ouvido, como se as dele pertencessem a um outro mundo".



"Entretanto hoje as pessoas reclamam que o centro de Dharma mais próximo fica *só* no bairro vizinho. "Ah se tivesse um perto de casa! Aí eu frequentaria..."

No final das contas, podemos nos perguntar se é o Buddhismo que deve se abrir e difundir, ou se são as pessoas interessadas que devem se levantar de suas poltronas. Já escrevi sobre isso, aliás, em "O Que Se Fazer Quando Se Está Só". Se não há pessoas interessadas, ativas e dispostas, não seria questão de perguntar para quê então deveria o Buddhismo existir no Brasil? Existe uma idéia comum que diz que onde não há mérito o Dharma não se estabelece. Eu não gosto da palavra "mérito", mas a idéia por trás me parece verdadeira. Se não há um jarro, para quê despejar água no chão? O Dharma só é necessário porque existem pessoas interessadas nele. Abrir e difundir o Buddhismo só para que o "Buddhismo" continue existindo, é fazer do "Buddhismo" uma entidade merecedora de existência própria, independente de para quem ele se dirige."

Encontrando Patrul Rinpoche



Entre os dias 4 a 8 de novembro, em Brasília, tivemos a oportunidade de encontrar o grande mestre Patrul Rinpoche. Através de sua profunda sabedoria e compaixão, demonstrou sua grande habilidade como professor ao apontar a natureza da mente.
Fomos muito bem recebidos pela Sangha Tibetana Kagyu Pende Gyamtso. Ao final da viagem tivemos a felicidade de conhecer a querida Gyokuen San e nos sentarmos juntos com a Sangha Kzazen.

Abaixo um texto do 1º Patrul Rinpoche


CONSELHOS DE MIM PARA MIM MESMO
Texto de Patrul Riponche


Vajrasattva, única deidade, Mestre,
Tu sentas-te num trono de lótus, de luz branca de lua cheia,
No desabrochar de cem pétalas, pleno de juventude.

Pensa em mim, Vajrasattva,
Tu que te manténs equânime dentro do universo manifestado;
Isto é Mahamudra, benção do pleno vazio.

Ouve lá, oh Patrul de mau Karma,
Praticante da distração.

Há eras que tu estás
Apanhado, entranhado e iludido pelas aparências.
Estás consciente disso? Estás?

Neste preciso momento, em que estás
Debaixo da magia da percepção errônea
Tens que ter atenção.
Não te deixes levar por esta vida vazia e falsa.

A tua mente devaneia
Tentando levar à cabo projetos sem utilidade:
É uma perda de tempo! Desiste!

Pensando sobre centenas de planos que queres executar,
Sem nunca ter tempo de os acabar,
Só sobrecarregas a tua mente.

Estás completamente distraído
Por todos esses projetos, que nunca mais acabam,
Mas que continuam a aparecer, como correntes de água.

Não sejas tolo, ao menos por uma vez:
Senta-te, simplesmente.

Ouvindo os ensinamentos, e tu já ouviste centenas deles,
Mas não tendo atingido o sentido profundo de nenhum deles,
Qual é o sentido de ouvir mais?

Refletindo sobre os ensinamentos, mesmo tendo-os escutado,
Se eles não te vêm à mente quando são precisos,
Qual o sentido de mais reflexão?
Nenhum.

Meditando sobre o ensinamento,
Se a tua prática de meditação ainda não curou
Os estados obscuros da mente:
Esquece-a!

Já somaste quantos mantras fizeste
Sem ter conseguido a visualização do kyerim?
Podes ter conseguido as formas de deidades belas e claras
Mas não estás a pôr fim ao sujeito e ao objeto.
Podes catalogar o que aparece como sendo espíritos maus e fantasmas,
Mas não estás a treinar o fluxo da tua própria mente.

Sobre as tuas ótimas quatro sessões de prática de sadhana,
Tão meticulosamente arranjadas:
Esquece-as!

Quando estás com boa disposição,
A tua prática parece ter imensa claridade;
Mas não te podes relaxar nela.
Quando estás deprimido,
A tua prática é bastante estável,
Mas não tem qualquer brilho.
Quanto à compreensão,
Tentas forçar-te a um estado semelhante a rigpa,
Como se estivesses a atirar a um alvo!

Quando essas posições de yoga e práticas mantém a
tua mente estável,
Só à custa de a manterem estrangulada:
Esquece-as!

Dar altas conferências
Não faz nenhum bem ao fluxo da tua mente.
O caminho da razão analítica é preciso e acutilante:
Mas é mais desilusão, caca imprestável.
As instruções orais podem ser muito profundas,
Mas não se tu não as puseres em prática.

Ler e reler os textos do dharma
Só serve para ocupar a tua mente e fazer arder os olhos:
Esquece-os!

Bates o teu pequeno tambor damaru - ting, ting -
E a tua audiência fica deliciada a ouvi-lo.
Recitas palavras acerca de oferecer o teu corpo,
Mas ainda estás ternamente agarrado a ele.
Bates os teus pequenos cimbales -cling, cling -
Sem ter o propósito último na tua mente.

A todo este equipamento de prática do dharma,
Que parece tão atraente:
Esquece-o!

Neste momento, os estudantes estão todos a estudar arduamente,
Mas no fim não vão conseguir manter o ensinamento...

Hoje, parecem ter apanhado a idéia,
Mas, mais tarde, nem um rasto dela fica.
Mesmo se um deles conseguir apreender um pouco,
Raramente aplica o apreendido à sua própria conduta.

A todas estas elegantes disciplinas do dharma:
Esquece-as!

Este ano ele realmente preocupa-se contigo,
Para o ano já não será assim.
A princípio parece modesto;
Depois se exalta e fica pomposo.
Quanto mais tu o paparicas e cuidas dele,
Mais ele se distancia de ti.

A estes queridos amigos
Que mostram faces tão sorridentes ao princípio:
Esquece-os!

O sorriso dela parece tão cheio de alegria,
Mas quem sabe se será realmente assim?
Por um momento de puro prazer,
São nove meses de dor mental.
Pode ser bom durante um mês,
Mas, mais cedo ou mais tarde, vai haver sarilho.

Às pessoas chatearam-te, à tua mente embrulhada,
À senhora tua amiga:
Esquece-os!

Essas reuniões, sem fim, de conversa
São só apego e aversão:
É mais caca, sem utilidade.
Na altura parece um entretenimento maravilhoso,
Mas, na realidade, só se está a espalhar histórias sobre os erros de outras pessoas.
A tua audiência parece estar a escutar polidamente,
Mas depois vão ficando embaraçados por ti.

Fala sem utilidade, que só te faz ficar com sede:
Esquece-a!

Dar lições sobre textos de meditação
Sem tu próprio teres ganhado
Experiência pela prática,
É como recitar um manual de dança
E pensar que é o mesmo que, realmente, dançar.

As pessoas podem escutar-te com devoção,
Mas não é o mesmo que a coisa real.

Mais tarde ou mais cedo, quando as tuas próprias ações
Contradisserem os ensinamentos, vais sentir-te envergonhado.

Pronunciar só as palavras,
Dar explicações do dharma que soam tão eloqüentes:
Esquece!

Quando não tens um texto a que te agarrar, anseias por ele;
Quando, finalmente, o obténs, mal olhas para ele...

Mesmo que o número de páginas seja pequeno,
É-te difícil arranjar tempo para copiá-las todas.
Mesmo que tu copiasses todos os textos de dharma que existem,
Não ficarias satisfeito.

Copiar textos é uma perda de tempo
(a menos que recebas pagamento por isso...):
Portanto, esquece!

Hoje estão felizes;
Amanhã, furiosas.
Com os seus momentos altos e baixos,
As pessoas nunca estão satisfeitas.
Mesmo que sejam simpáticas,
Podem não te acorrer quando tu necessitas delas,
Desapontando-te ainda mais.

A toda essa polidez, a cultivar
Comportamento cortês:
Esquece-a!

Trabalho mundano e religioso
Pertence à esfera dos polidos.
Patrul, meu amigo, não é para ti!

Nunca repararam no que acontece sempre?
A um velho boi, depois de todo o trabalho de o pedir emprestado para ele prestar os seus serviços,
Parece não ter restado nenhum desejo,
Exceto para adormecer.

Sê também assim - sem desejo.

Somente dorme, come, mija e caga.
Não há mais nada que se tenha que fazer nesta vida.

Não te envolvas noutras coisas:
Elas não são o objetivo.

Mantêm um perfil comedido,
Dorme.

Neste triplo universo
Quando tu és mais modesto que a tua companhia
Deves tomar o assento mais baixo.

Se acontecer que tu sejas aquele que é superior,
Não fiques arrogante.

Não existe nenhuma necessidade absoluta de ter amigos íntimos;
Ficas melhor mantendo-te contigo mesmo.

Se não tiveres nenhuma obrigação mundana ou religiosa,
Não fiques a desejar obter uma!

Se deixares ir tudo,
Tudo, tudo...

Esse é o verdadeiro objetivo!



Estes conselhos foram escritos pelo praticante Trime Lodro (Patrul Rinpoche) para o seu amigo íntimo Ahu Shri (Patrul Rinpoche), especificamente talhados para as suas capacidades.

Estes conselhos devem ser postos em prática.

Mesmo
que tu não saibas praticar, deixa ir tudo - é o que eu realmente quero dizer. Mesmo que não sejas capaz de ser bem sucedido na tua prática do dharma, não fiques triste nem zangado.

Possa isto ser virtuoso.